domingo, dezembro 07, 2008

Cabalá







Cabalá: aquilo que é recebido. Aquilo que não pode ser conhecido apenas através da ciência ou da busca intelectual. Um conhecimento interior que tem sido passado de sábio para aluno desde o despertar dos tempos. Uma disciplina que desperta a consciência sobre a essência das coisas.

Entramos neste mundo e nossos sentidos encontram sua crosta externa. Tocamos a terra com nossos pés, a água e o vento atingem nossa pele, recuamos perante o calor do fogo. Escutamos os sons e ritmos. Vemos formas e cores. Logo começamos a medir, a pesar e a descrever com precisão. Como cientistas, registramos o comportamento dos compostos químicos, das plantas, animais e seres humanos. Nós os gravamos em video-tape, observamos sob o microscópio, criamos modelos matemáticos, enchemos um supercomputador com dados a seu respeito. De nossas observações, aprendemos a domar nosso ambiente com invenções e engenhocas, e então nos damos um tapinha nas costas e dizemos: "Isso mesmo, conseguimos."

Mas nós mesmos, nossa consciência, que está examinando este mundo, residimos em uma camada mais profunda. Eis por que não podemos deixar de perguntar: "E sobre a coisa em si mesma? Aquilo que está lá antes que a medíssemos? O que é matéria, energia, tempo, espaço - e como vieram a ser?

Para explicar nosso mundo sem examinar esta profundeza interior é tão superficial quanto explicar o trabalho de um computador descrevendo as imagens vistas no monitor. Se virmos uma bola movendo-se para cima e para baixo na tela, diríamos que está ricocheteando contra o fundo da tela? Os dispositivos na sua barra de rolagem exercem alguma força sobre a página dentro da tela? A barra do menu tem realmente os menus ocultos atrás dela?

O autor de um software de uso facilitado seguiu regras consistentes para que você possa trabalhar confortavelmente dentro dele. Se for um jogo de alguma complexidade, ele precisou determinar e seguir um grande conjunto de regras. Mas uma descrição destas regras não é uma explicação válida de como isso funciona. Para isso, precisamos ler seu código, examinar o equipamento, e, mais importante - examinar a descrição de seu conceito original. Precisamos vê-lo da maneira que o autor o vê, como evolui passo a passo de um conceito em sua mente através do código que ele escreve, até os pontinhos fosforescentes minúsculos na tela.

O código por trás da realidade, o conceito que instila vida às equações e as torna reais. Homens e mulheres sacrificaram seu alimento, seu conforto, viajaram grandes distâncias e pagaram com sua própria vida para chegar a conhecer estas coisas. Não há uma só cultura neste mundo que não tenha seus ensinamentos para descrevê-las. Nos ensinamentos judaicos, elas são descritas na Cabalá.

Segundo a tradição, as verdades da Cabalá foram conhecidas por Adam (Adão). Aquilo que sua mente apreendeu, nenhuma outra mente pode conceber. Mesmo assim ele foi capaz de transmitir um vislumbre de seu conhecimento a algumas das grandes almas que dele descenderam, como Hanoch e Metushelach. Foram eles os grandes mestres que ensinaram Nôach (Noé), que por sua vez ensinou seus próprios alunos, incluindo Avraham (Abraão). Avraham estudou na academia do filho de Nôach, Shem, e enviou seu filho Yitschac para lá estudar, depois dele. Yitschac por sua vez mandou seu filho Yaacov estudar com Shem e com o bisneto de Shem, Ever.

Adam, Nôach, Avraham - estes foram pais de toda a humanidade. Eis por que você encontrará alusões às verdades que eles ensinaram seja onde for que tenha chegado a cultura humana.

Mesmo assim, a fonte essencial para a Cabalá não é Adam ou Nôach ou mesmo Avraham. É o evento no Monte Sinai, onde a essência primordial do cosmos foi desnudada para que uma nação inteira a contemplasse. Foi uma experiência que deixou uma marca indelével sobre a psique judaica, moldando por completo nossas idéias e nosso comportamento desde então.

No Sinai, a sabedoria interior tornou-se não mais uma questão de intuição ou revelação particular. Era então um fato que havia penetrado em nosso mundo e se tornado parte da história e da experiência dos mortais comuns.

Eis por que a Cabalá não pode ser chamada de filosofia. Uma filosofia é o produto de mentes humanas, algo com que qualquer outra mente humana pode jogar, espremê-la ou esticá-la segundo os ditames de seu próprio intelecto e intuição. Mas Cabalá significa: "que é recebida." Recebida não apenas de um professor, mas do Sinai. Assim que o aluno tenha dominado o caminho deste conhecimento recebido, ele ou ela pode encontrar maneiras de expandi-lo ainda mais, como uma árvore se ramifica a partir de seu tronco. Mas será sempre um crescimento orgânico, jamais tocando a vida e a forma essenciais daquele conhecimento. Os ramos, galhos e folhas irão apenas onde deveriam para aquela árvore em particular - um bordo jamais se tornará um carvalho, e jamais um aluno revelará um segredo que não estivesse oculto nas palavras de seu mestre.
























































































In: http://www.chabad.org.br/datas/shavuot/a%20tora/cabala.html

terça-feira, novembro 18, 2008

Avô

Djavan

Composição: Djavan / Flavia Virginia

E se eu parar de tomar pra sempre sundae
e não amar lévi-strauss em seu enleio
se eu achar démodé , quem serei?
E se tiver tudo chato e o céu for feio
e eu decidir que chopin , não solfejarei
se eu fizer um ar blazè, quem serei?
Quando eu for saberei.

Como eu era um homem longe do que sou
preocupado em me mostrar capaz...
Nem que eu queira, hoje posso ser tal rapaz
não sou mais, não sou mais, não sou mais
não sou mais enfim
nem mesmo o que eu serei, sou
não sou mais, não sou mais.

E no balaio da construção de um homem
revejo os moldes e as massas que eu já usei
pois viver é reviver, hoje eu sei
quem eu for, já encontrei
e de quebra a experiência me ensinou:
é preciso juventude para que eu me torne avô
è preciso juventude
quem me dera tê-la intacta a cada era
como uma flor
que algum dia, alguém espera em outra porta
que o futuro preparou.

Avô


terça-feira, novembro 11, 2008

DARUMA-SAN

Na China antiga havia um bonzo chamado DARUMA, o qual queria saber a verdade da vida. Após várias tentativas a procura da prática ascética, nada conseguiu. Finalmente então, ele decide sentar-se em frente à parede de um templo, meditando sobre a vida, até chegar a uma gama verdadeira, ou seja, à essência da vida.

Ao passar um ano ele nada conseguiu. Após dois anos, nada. Após três anos, nada.... Assim, quando ele atingiu o nono ano de meditação, finalmente conseguiu chegar ao reconhecimento sobre a verdadeira essência da vida. DARUMA é o fundador da religião ZEN BUDISMO.

A religião ZEN BUDISMO foi levada para o Japão no início do século 12. Mais tarde, na época de MUROMACHI-JIDAI (1333 a 1568), surge no Japão o boneco "DARUMA" na mesma posição em que Sr.Daruma sentava-se para meditação bem como imitando bonecos teimosos trazidos da China. Assim, começou a propagar como sendo uma decoração.

Em meados da época de EDO (1603 a 1868), chegou ao formato atual. Nessa época já havia no âmago do povo japonês o sentimento de se proteger usando o DARUMA como um talismã para evitar de todos os males existentes na colheita agrícola, caça e pesca... Desde então, o talismã DARUMA é utilizado nas casas comerciais, nos lares e no decorrer do tempo, pelos políticos em campanha eleitoral.

O povo japonês costuma comprar esse boneco que é vendido em barraquinhas localizadas próximo aos templos e santuários , no ano novo, para que se concretize o sonho depositado no ano que se inicia. Ao comprá-lo, vem sem os olhos: quando você quiser que o seu desejo se realize, pinte um dos seus olhos e, se o pedido for atendido, o outro deverá ser pintado em sinal de gratidão.

In: http://www.sonoo.com.br/Daruma.html

segunda-feira, novembro 10, 2008

Parangolé

INSTRUÇÕES para feitura-performance de CAPAS FEITAS NO CORPO

Hélio Oiticica

1- cada extensão de pano deve medir 3 metros de comprimento.
2- o pano não deve ser cortado durante a feitura da capa, de modo a manter a estrutura-extensão como base viva da capa.
3- alfinetes de fralda devem ser usados para a construção da capa , que será depois cosida.
4- a estrutura da capa-construida-no-corpo deve ser improvisada pelo participador; se a ajuda de outros participadores vier a calhar, ótimo; a estrutura deve ser construída em grupo em cada corpo participante, e feita de modo a ser retirada sem destruir, como uma roupa.
5- um grupo pode construir uma capa para várias pessoas, numa espécie de manifestação coletiva ao ar livre.
6- o uso de dança e/ou performances criadas por outros indivíduos é essencial à ambientação dessa performance: assim como o uso do humor, do play desinteressado, etc. de modo a evitar uma atmosfera de seriedade soturna e sem graça.

quarta-feira, outubro 22, 2008

Curta: Mão Mãe - Marcos Magalhães - 1979

Asanga, um grande praticante buddhista indiano, retirou-se em uma caverna para meditar dia e noite no Buddha Maitreya. Depois de seis anos, não tinha tido um único sonho auspicioso, uma única visão — nenhum sinal de realização. Então, concluiu que sua meditação era inútil. Deixou a caverna e, ao seguir pela estrada, passou por um homem que esfregava um lenço de seda numa coluna de ferro. Asanga perguntou ao homem, "O que o senhor está fazendo?"

"Estou fazendo uma agulha", respondeu o homem.

Asanga pensou, "Mas que perseverança! Ele está esfregando uma coluna de ferro com um lenço de seda para fazer uma agulha, e eu sequer tenho paciência suficiente para permanecer em retiro." Caminhou de volta para sua caverna e começou a meditar, dia e noite, sobre o Buddha Maitreya.

Depois de mais três anos de meditação, ela ainda não havia recebido sinal algum de realização. Nenhum sonho, nenhuma visão, nada. Novamente, muito desanimado, deixou o retiro. Ao seguir pela estrada, viu um homem que mergulhava uma pena num balde d'água e a passava sobre a superfície de um enorme rochedo. Asanga perguntou ao homem o que fazia.

"Este rochedo está fazendo sombra sobre a minha casa," respondeu, "então eu o estou removendo."

Asanga pensou, "Eis aqui alguém que, para ter apenas um pouco de Sol sobre seu telhado, se dispõe a ficar em pé interminavelmente, removendo um rochedo com uma pena. E eu não consigo sequer meditar até que obtenha um sinal." Então, voltou para a caverna e sentou-se em meditação.

Após um total de doze anos em retiro, ele ainda não havia recebido sinal algum. De novo, desencorajado e decepcionado, partiu. Ao seguir pela estrada, desta vez encontrou um cachorro muito doente. A parte inferior de seu corpo estava apodrecida por gangrena e cheia de larvas de moscas varejeiras. Sem as duas pernas de trás, ele conseguia apenas se arrastar pela estrada. Ainda assim, voltava-se para todos os lados, tentando morder quem estivesse em volta. O coração de Asanga se comoveu. "Este pobre cachorro", pensou, "O que posso fazer para ajudá-lo? Tenho que limpar a ferida, mas com isso posso matar as larvas. Não posso tirar a vida de um para preservar a de outro; toda vida tem valor."

Por fim, decidiu que, se usasse sua língua com cuidado para retirar as larvas da ferida, poderia salvar tanto os insetos quanto o cachorro. A idéia era repugnante, mas fechou os olhos e se abaixou. Quando abriu sua boca, sua língua tocou não o animal, mas o chão. Abriu os olhos. O cão havia sumido e ali estava o Buddha Maitreya.

"Faz anos e anos que estou rezando a você", exclamou Asanga, "e esta é a primeira vez que você aparece!"

O Buddha respondeu muito suave, "Desde o primeiro em dia que você começou sua meditação, tenho estado a seu lado. Mas, por causa do dos venenos da sua mente e dos enganos e ilusões criados por sua não-virtude, você não conseguia me ver. Era eu o homem que esfregava a coluna, era eu o homem que passava a pena no rochedo. Somente quando apareci como esse cachorro apodrecido é que você teve compaixão e altruísmo suficientes para purificar o karma que o impedia de me ver".

(Chagdud Tulku Rinpoche. Portões da Prática Budista.
Traduzido por Manoel Vidal, revisado por Cinthia
Sabbado, Marta Rocha e Maurício Sabaddo.
Três Coroas: Rigdzin, 2000. Pág.
85-87. )


sexta-feira, abril 18, 2008

Município do Rio já tem 56.919 casos de dengue

18/04/2008 - 21h21
Secretaria de Saúde não registrou novos óbitos nesta sexta-feira.
Em menos de quatro meses, a dengue já matou 89 pessoas em todo o estado.
Do G1, no Rio

O município do Rio registrou mais 1.466 casos de dengue de quinta para sexta-feira (18), segundo balanço divulgado pela Secretaria municipal de Saúde. O número total de casos só na cidade do Rio chega a 56.919 só este ano. Como não houve registro de novos óbitos, o numero de mortos continua em 54. Em menos de quatro meses, a dengue já matou 89 pessoas em todo o estado.


Cerca de 20 agentes de controle de endemias realizarão ações operacionais, eliminando possíveis criadouros do mosquito Aedes aegypti e tratando reservatórios que não puderem ser removidos. Neste sábado (19), ações ocorrerão em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio. No Conselho Distrital da área ocorrerão palestras e encontros de voluntários para formação de brigadas anti-dengue nos bairros de Santa Cruz, Sepetiba e Paciência.

Mutirões de combate à doença
O sábado também será de mutirões, que serão realizados nas comunidades da Serrinha, em Madureira, e do Quitungo, em Brás de Pina, Zona Norte do Rio, da Areinha, no Itanhangá, de Areal I, em Jacarepaguá, e Fazenda Marambaia, em Campo Grande, na Zona Oeste do Rio.

Neste fim de semana, 30 postos de saude funcionarao por 24 horas.A secretaria informou ainda que, na próxima terça-feira (22), o ponto facultativo foi suspenso, em mais uma medida na luta contra a doença.

quarta-feira, abril 16, 2008

sexta-feira, abril 11, 2008

Mortalidade de crianças indígenas é o dobro da média nacional, diz relatório

11/4/2008 09:03:00

Brasília - Entre os indígenas, a mortalidade infantil é o dobro da média nacional, e os índices de desnutrição também são altos. É o que revela o relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil 2006/2007, elaborado pelo pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

De acordo com o relatório, apresentado ontem (10) na 46ª Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), disenteria, pneumonia e tuberculose foram algumas das causas das 51 mortes de crianças indígenas nos últimos dois anos - 29 em 2006 e 22 em 2007.

"Em Mato Grosso [em 2006], 17 crianças morreram em conseqüência da desnutrição. Em Rondônia, foram registrados sete casos e, em Tocantins, 11 casos de óbito infantil causados por desnutrição, desidratação e, especialmente, por falta de tratamento adequado", registra o capítulo sobre mortalidade infantil do relatório.

Segundo o levantamento do Cimi, os estados de Mato Grosso do Sul, Santa Catarina e Tocantins foram os que apresentaram o maior número de mortes por desnutrição e desidratação infantil entre os índios. As causas apontadas pelo relatório vão desde a saúde precária das mães à falta de transporte para os postos médicos.

"É conseqüência e testemunho da saúde extremamente precária das mães que, amamentando, não conseguem alimentar seus filhos e, além disso, não têm assistência pré-natal e pós-natal adequada." O levantamento aponta ainda a "falta de alimentação, terra, segurança alimentar, água potável, saneamento, prevenção, vacinação e assistência médica" entre os fatores que levam a tal situação.

O documento do Cimi relaciona 74 casos de desnutrição entre índios em 2006 e 491 em 2007. Só em Mato Grosso do Sul, são 184, segundo o coordenador de Saúde Indígena da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) no estado, Zelik Trajber, conforme relatado no documento.

"Das 2,3 mil crianças de zero a cinco anos atendidas pela Funasa, 184 sofrem de desnutrição e ainda há 322 crianças sob risco de desnutrição", informa o relatório.

Fonte : Agência Brasil

In:
http://www.prontuariodenoticias.com.br/noticias.asp?secao=DE&id=3232

sexta-feira, abril 04, 2008


The False Mirror. 1928.
[Oil on canvas, 21 1/4 x 31 7/8" (54 x 80.9 cm)]
René Magritte (Belgian, 1898-1967).

quinta-feira, março 27, 2008

Arnaldo Jabor - O homem versus o mosquito


O Globo
25/3/2008

O Rio é uma calamidade urgente que tem de ser assumida

Não interessa saber se a dengue é uma epidemia ou não. A dengue é apenas a forma microbiológica que expõe o caos geral da administração do Rio. Os vírus proliferam pelo mesmo fertilizante que estimula a corrupção, a violência, a vergonha burocrática. A verdadeira epidemia é a administração da cidade que já atinge um grau de gravidade talvez irreversível.

Vivemos no Rio (oh leitores de outros estados!...) a sensação permanente do Insolúvel. Já temos a dengue, a febre amarela; um dia chegaremos à perfeição da varíola. Mas muitos sintomas eclodem alem da dengue: depressão, miséria, violência, ignorância. A própria crise psicótica do Cesar Maia também é um sintoma. Ele, que pareceu um exemplo de pragmatismo para quebrar a cadeia do populismo, entrou em catatonia, em paralisia mental, e não fala mais. Diante do Insolúvel, ele emite ruídos de e-mail como um robô quebrado.

O Rio de hoje é o filho defeituoso que a ditadura militar criou, pela fusão com o Estado fluminense, a estratégia "geiseliana" de afastar o MDB de uma possível vitória na política nacional em 75.

A des-fusão dos dois estados e a volta da Guanabara é um tema que surgiu, fervilhou e esfriou de novo, como tudo aqui. Seria uma utopia? Na Prefeitura, na Câmara Municipal, assembléias, repartições, vemos a cenografia e figurinos de nossa desgraça.

Estamos salpicados de favelas, de onde descem hordas de assaltantes para pescar cidadãos como num parque temático, somos governados por populistas de direita há décadas. Nosso melhor governador ("prefeito" do Estado da Guanabara) foi o Carlos Lacerda. Homem inteligente e competente - o ódio máximo de minha juventude - ( podem me esculhambar, velhos comunas...), mas que nos trouxe luz, água, túneis, urbanização e o conceito de administração moderna contra a politicagem fisiológica. Lacerda, com todos seus defeitos, era um atalho no populismo que tirou o Rio do ciclo "de dia falta água, de noite falta luz..."

Hoje, há um caldo de cultura de onde germina nossa tragédia. Ou melhor, duas grandes poças de cultura que se somam.

A primeira grande poça trágica é a imensa ignorância da população pobre, presa da demagogia de oportunistas que usam a religião, o clientelismo, o cabresto, grana, tudo para conquistar votos.

A crassa ignorância dos despossuídos é o chão onde crescem os pseudo-políticos, como a água parada gesta ovos de mosquitos.

A segunda poça de germes é mais sutil. Não está no analfabetismo, nem na crendice, nem na ingenuidade. Está no carioca médio e em sua "cultura malandra". Depois de décadas de desgraça, ainda não sabemos como agir, como nos mobilizar, além de vagos protestos, cartas a leitores ou comentários (como eu mesmo faço), na facilidade da indignação impotente.

Atraso x modernização

Cariocas, somos considerados criativos e manemolentes, quando hoje estamos mal informados e sem inspiração. Somos malandros com o terno esfarrapado, a navalha sem aço e o chapéu panamá rasgado. O carioca tem uma "poética" irresponsabilidade política. Carioca gosta de falar de política mas não de agir politicamente; tudo se afoga no chope ou na praia e chegamos, no máximo, a movimentos abstratos, pedindo paz, abraçando a Lagoa, cantando, chorando. O carioca é ideológico, mas deixa a política para os canalhas. E nossa única saída para a tragédia que vivemos seria uma virada pragmática, uma mudança, uma diferença de métodos e de ética. O Rio está organizado para "não" funcionar.

Tornou-se impossível governar sem uma macro-mudança administrativa. Precisamos de cinturões industriais na periferias, precisamos criar algum objetivo econômico para a região, seja a criação de uma "hong kong" carioca, uma base financeira e cultural. A idéia de que há uma "solução" para o Rio é uma falácia. Precisamos de atalhos, de imaginação. Não dá para retornar a uma "normalidade" ideal, apenas por uma corriqueira substituição de poder. O Rio tem de planejar seu futuro em cima de um luto, da aceitação de uma grave encrenca em estado adiantado.

Com a aproximação das eleições para a Prefeitura, dois cenários se apresentam na paisagem política: o atraso e a possibilidade de uma modernização. Marcelo Crivella é o uso da política como instrumento de outro poder. A prefeitura não como um instrumento para o bem da cidade. A cidade não como fim, mas como meio. Seus eleitores já foram escolhidos e apontados em sua primeira declaração contra Fernando Gabeira: "Ele é a favor de homem com homem, aborto e maconha". É nítido que ele vai usar a superstição, o moralismo tacanho, a ignorância e a obediência religiosa para se eleger, depois de ter sabiamente desviado Wagner Montes do caminho, ele o mais forte candidato no mundo da ignorância pública.

Para esta vertente político-religiosa, quanto mais paralisada a máquina da cidade, melhor. Quanto mais indefesos forem os aparelhos do estado, melhor. Depois do populismo chaguista no estado, depois da honestidade incompetente de Saturnino Braga, depois do brizolismo, da piração de Cesar Maia, involuímos para o populismo da fé.

Por outro lado, a possibilidade de eleição de Fernando Gabeira pode ser uma oportuna retomada de um pragmatismo que não se vê desde o boom do Estado da Guanabara. Não falo por salvacionismo, nem Gabeira seria um bonaparte. Falo porque ele pode criar uma nova vertente política, cortando caminhos pela imaginação, pela criatividade e pelo nível intelectual e contemporâneo que ele representa. Mudança de rumos, mudança: quase um Obama carioca.

Quem pode atrapalhar Gabeira? Homens e mulheres de bem, como Chico Alencar, Jandira, Eduardo Paes, que pensam ainda em termos legítimos (sem dúvida) mas também sem possibilidade alguma de vitória.

Eles teriam de entender e se coligar com o único que tem uma chance de vencer o populismo psicótico (sou um romântico). Entender que o Rio não é uma cidade a mais à espera de uma eleição. Somos uma calamidade urgente que tem de ser assumida, como o desmatamento da Amazônia ou a seca no Nordeste.